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domingo, 19 de março de 2023

O último "lance"... (março de 2023)

A esperança, a esperança! ... O mar longe, movido
Solta, de quando em quando, um lúgubre gemido...

Costa de Caparica, Alberto Carlos Lima, década de 1900.
Pescadores lançando uma embarcação ao mar,
Arquivo Municipal de Lisboa

O pescador da Costa abandona a cabana;
Deixa filhos, mulher!... Na carreira vesana
Vae perguntar trabalho, e sem poder lograr
Companha, que se afoite ao truculento mar!

Costa de Caparica, Alberto Carlos Lima, década de 1900.
Colégio do Menino Jesus e casas típicas de pescadores.
Arquivo Municipal de Lisboa

No areal da Costa não rebenta a vaga;
Todo o mar sereno! Pobre pescador!...
Lança em vão os olhos... Da deserta plaga
Não descobre ao longe nem signal, que traga
Negra de sardinhas, ondulando á flor!

Costa de Caparica, Alberto Carlos Lima, década de 1900.
Pescadores puxando uma embarcação para o areal,
Arquivo Municipal de Lisboa

Não seja o tempo fatal
Aos do mar, e ao pescador;
Que o mais este vendaval
É propicio ao lavrador!

Pesado estoira o mar, pelo areal da Costa;
Sibila, range, estrala, o pinheiral da encosta! (1)


(1) Raimundo António de Bulhão Pato, Livro do Monte, georgicas, lyricas, 1896, Typographia da Academia, Lisboa.

sábado, 14 de maio de 2022

Maria Ritta do Adrião: alojamento local (desde 1859)

Duns apontamentos que nos foram proporcionados pelo Snr. Francisco José da Silva, Mestre das artes de pesca, extrahimos os apontamentos que se seguem e que mal podem aspirar a simples elementos de estudo para a historia da localidade:

Vista aérea da Costa de Caparica (detalhe), 1937.
Arquivo Municipal de Lisboa

A pesca começou a ser explorada na Costa por algarvios e ílhavos que ali vinham pescar nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro, chamados da sáfra; construíam então eles próprios umas singelas e pequenas choupanas a que largavam fôgo quando se retiravam para as suas terras.

Em 1770 fixaram ali domicilio, em barracas já com maiores comodidades, com as suas companhas, os mestres: José Gonçalves Bexiga, algarvio, Joaquim Pedro, de Ílhavo; Romualdo dos Santos, algarvio; José Rapaz, de Ílhavo. Dado o exemplo, em anos a seguir, ali se fixaram também os mestres: José dos Santos, Jerónimo Dias, João Lopes e Manuel Toucinho.

Um dos primeiros cuidados dos povoadores foi a construção de uma Igreja — que foi feita simplesmente de junco e taboado.

As simples barracas de pescadores, de junco e colmo, foram-se aperfeiçoando, enchendo-se de conforto e comodidades, até ao ponto de nelas se proporcionarem festas verdadeiramente faustosas a que concorriam dos arredores fidalgos e literatos dos meados do seculo passado.

Ainda há tradições directas de algumas dessas festas e é frequente encontrarem-se na Costa resto de mobílias antigas, das melhores que certamente havia nessa época. Oratórios e imagens sagradas, conservadas religiosamente, constituem verdadeiras preciosidades e dão ideia da opulência com que chegou a viver a colónia piscatória, em tempos áureos. (1)

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Em 1859 José Augusto Sacotto Galache e eu principiámos as nossas caçadas no Juncal da Costa (...)

Um dia, em Dezembro (7), véspera de Nossa Senhora da Conceição, embarcámos, noite cerrada ainda, com Lourenço e seus dois filhos mais velhos.

Tempo sêcco, sem vento, e intensamente frio; a geada caía em carambinas. Proa ao Torrão. Lourenço da Pinha, expansivo, animava os filhos: — Vamos, rapazes, de voga arrancada, que é para aquecer.Havia aguas de monte, e o barco, mal vinha clareando, abicou defronte da Quinta do Miranda (...)

O estômago não tinha a mais leve memoria do almoço; a ambição de caçar no dia seguinte não nos mordia menos de que o appetite voraz. Resolvemos ficar; mas ficar aonde e comer o quê? A sorte.

Entrámos na povoação. Tudo choças de colmo; muitas levantadas sobre o arcaboiço de um velho barco.

Uma casa de um só andar, com armas reaes, bojudas como o abdómen do ladino e bondoso monarcha D. João VI, que foi alli por mais de uma vez.

De pedra e cal meia dúzia de casitas mais, quando muito. íamos andando por aquelle labyrintho de cubatas e á porta de um ferrador demoscom uma rapariguita dos seus dez annos, de cara insinuante, vestido de chita, meias muito brancas, sóccos, cabello em trança e bem tratado.

— Ó pequena, olha lá. Haverá aqui alguma casa onde se possa ficar e se coma alguma coisa?

— Pois não ha, meus senhores!... É a tia Maria Rita do Adrião, accrescentou, dando á sua voz crystallina certa expressão que indicava a grandeza da personagem a quem se referia.

Desenho da Costa antiga, autor António Lopes Martins, Col. Particular.
Rui Manuel Mesquita Mendes (fb)


Levou-nos á tia Maria, e tal foi o agasalho que por mais de trinta annos frequentei aquella casa com o melhor dos meus amigos. (2)

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Dalli a pouco estávamos todos reunidos na casa de jantar da sr.ª Maria do Adrião. Ao lado, na sala, de paredes estucadas, e tecto com relevos — uma surpresa para nós aquella restauração — a menina Cazimira extrahia das gavetas das suas bellas commodas de polimento, e mostrava ingenuamente ás senhoras, as riquezas e os primores da sua guarda-roupa — chales, vestidos de cores garridas, saias com rendas finas, camisas bordadas, lenços de seda de ramagens, que tão bem ficam, e tanto realce dão áquelles rostos campesinos, já illuminados de tons quentes pelo ar do campo e pelo sol. (3)

Maria Ritta do Adrião
O António Maria, 18 de setembro de 1884



(1) Almada na História, Boletim de Fontes Documentais nº 32 (2019)
(2) Bulhão Pato, Memórias, Vol. III, Lisboa, Typ. da Academia Real das Sciencias, 1907
(3) Zacharias d'Aça, O Tiro Civil n.° 139, quarta-feira 1 de junho de 1898

Leitura relacionada:
A praia da Costa (Caparica): Estancia balnear, de cura de repouso e de turismo

Artigos relacionados:
Gentes da Costa (e a miguelista exaltada) em 1828
Maria Rita do Adrião (1811-após 1903)
Bulhão Pato, uma caçada no Juncal, por Zacharias d'Aça (VI)
Nas arribas do mar (prosa)
Nas arribas do mar (faíscas de fogo morto)

terça-feira, 25 de janeiro de 2022

Migração de Pato bravo!

Descreveremos o episódio, que determinou a mudança da residência do poeta para o Monte de Caparica.

Bulhão Pato por Alberto Carlos Lima.
Arquivo Municipal de Lisboa

Bulhão Pato, que sempre viveu modestamente, fora morar para uma casinha na Lapa. Antes de fechar o contracto, impoz ao senhorio a condição de nunca lhe aumentar a renda. Este aceitou a cláusula e concluiu:

— "Esteja V. Ex.a tranqüilo. O homem conhece-se pela palavra e o boi pelos c...".

Passados tempos, o senhorio escreveu ao poeta, e, invocando pretextos especiosos, avisou-o que lhe aumentava a renda.

Dias depois, dirigiu-se a casa do inquilino, a fim de saber a resposta.

— "A resposta, gritou Bulhão Pato lã de dentro e apoplético de cólera, a resposta é que, não podendo já conhecêl-o pela palavra, o fico conhecendo pelos c...".

Nas salas do romantismo, chamavam a Bulhão Pato — o Pato bravo... (1)


(1) Pinto de Carvalho, Lisboa de Outrora (vol. i)

Mais informação:
Alexandre Flores, Bulhão Pato e a sua mudança para a Outra Banda... para o Monte de Caparica...

Leitura relacionada:
Bulhão Pato, Livro do Monte, georgicas, lyricas, Lisboa, Typographia da Academia, 1896

Tema:
Bulhão Pato


sábado, 22 de janeiro de 2022

Paquita (canto xiv): no Monte e na Costa

Paquita por Bulhão Pato. O conhecido poema de Bulhão Pato na sua forma definitiva, no seu uniforme para a Posteridade. Obra criticada, de valor estabelecido, não a rebuscaremos afim de lhe marcar o futuro, porque já lh'o vemos, e dos mais invejaveis no presente. (1)

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Na solidão do Monte, onde hoje vivo ,
Soccorrer-me á memoria é o que me resta ;
Prazer ainda — embora pungitivo !
O sol, que eu via tanta vez em festa .
Agora apenas, sobre certas covas ,
Deixa cair uma sumida aresta !


Bulhão Pato, bilhete postal illustrado, colecção Artes e Lettras, Paulo Guedes & Saraiva, década de 1700.
Delcampe


Vae , no ponente , desfolhando as rosas ,
Que viçaram na fresca primavera ;
Pode ser que resurjam luminosas . . .
Vivamos da chimera — se é chimera
— De que no dia eterno as reveremos
Nas nebulosas da infinita esphera !


Ninguem pode affirmal - o , em negal - o :
Inda assim , no declivio da existencia ,
O sublime seria acredital - o !
Estamos vendo agora a quinta essencia
Do mysticismo nos modernos vates ,
Com as versaes , em plena florescencia !


Ninguem a gloria conquistou sem crença .
Ha pouco que um espirito elevado ,
Hontem ainda ! — uma bondade immensa ,
Um coração de justo , um inspirado ,
Alma de Christo , se tivesse crenças ,
Manchou de sangue o nome immaculado !


" Morrer . . . sonhar , talvez ! " — Longe o remorso
Do meu modesto e socegado leito !
Encarar o infinito , e sem esforço ,
O anhelito final soltar do peito . . .
Depois , por mão amiga , umas violetas
Postas ao lado do jazigo estreito !


Já o tenho marcado , e bem marcado ,
Sobre as ribas do mar , o cemiterio
Das lagrimas dos pobres orvalhado !
Dá sombra e paz ao meu eremiterio ;
Vibram de tarde ao vento os seus cyprestes ,
Como as cordas do mystico psalterio !

A luctar com as ondas agitadas ,
E a corrente contraria e pertinaz ,
Varreu - me o tempo as ambições sonhadas !
Ficou a derradeira , - mas vivaz ,
Meu unico laurel este epitaphio : "
Era um homem de bem .  Descance em paz ! "


Vista panorâmica de Lisboa ocidental, Maria Guilhermina Silva Reis.
Cabral Moncada Leilões

Batalhar ! batalhar ! Ao fim do dia ,
Quando mettemos na bainha a espada ,
Que resta da victoria , que sorria ?
Desfez - se em fumo a gloria conquistada ,
E da batalha ingente apenas ficam
Cicatrizes e lagrimas — mais nada !


Que vae nessa torrente lodacenta ?
Lodacenta , digo eu ! . . . O realismo ,
O proprio realismo , não inventa
Palavra obscena para tal cynismo ,
Que gera o tedio , e traz o suicidio ,
Sem as vertigens que produz o abysmo !


Com esgares truões uma caterva ,
Esfarrapando a tunica de Christo ,
No desenfreio da ambição proterva !
Fumosos , d ' um orgulho nunca visto ,
E charlatães , bufando panaceias ,
Para dar cabo mais depressa d ' isto !


" Camões , grande Camões , quão semelhante
Acho o meu fado ao teu , quando os cotejo ! "
Findando o teu poema , agonisante
Vias a patria ; assim a patria eu vejo ,
Ao terminar estas modestas paginas ,
Eu sombra , eu nada , que a teu pés rastejo !


Paisagem, Caparica, Narciso Morais, 1951
Cabral Moncada Leilões

As rispidas lufadas da invernia ,
E os bravos desgarrões do sudoeste ,
Passaram já . Rompeu um bello dia !
Perto d ' aqui , o pinheiral agreste
Manda um aroma salutar e vivo ,
Na branda viração , que vem do leste .


Não puxa o mar ao longe . Bom signal !
A lua veiu em pé , e as pontas finas
Cravando - se na esphera sideral ;
As estrellas tremendo e diamantinas .
Andam na Costa as negras de sardinha ,
Surgindo á flor das aguas crystalinas .


Costa da Caparica, Grupo de pescadores, Carlos Mendes, 1901.
Biblioteca Nacional de España

Cresceu a palmos o relvão em dias ;
Convida o chão ; faiscam as enchadas ,
Ao vivo sol que alegra as manhãs frias .
Cavar fundo ; rasgar essas chapadas ,
Que o vinho tem fundido , e a terra é prospera ,
Por todo este almaraz , ás baceladas !


Vão as redes ao mar . Alvorotados
Acodem , altarrões , os alcatrazes ,
E , aos cardumes nadantes e prateados ,
Atiram - se famintos e vorazes ! A monção é real !
Formoso dia ! Agora é certo o lanço .
Ao mar , rapazes !


A pesca de dezembro , a mais rendosa ,
A força dos constantes aguaceiros
Falhou , e foi a quebra desastrosa !
Os mestres d ' artes mais aventureiros
Não poderam romper de cara ao tempo
Que teve de peor os nevoeiros !


Costa da Caparica, O arraste da rede, Carlos Mendes, 1901.
Biblioteca Nacional de España

Alar ! Lá vem a rêde salvadora :
As mulheres , nos médos , mãos erguidas ,
Em prantos , a invocar Nossa Senhora .
Não tem de receiar perda de vidas ;
Mas se o sacco não pode com o peixe ,
Que enormes perdas se darão agora !


Ganhou a praia a mole reluzente ,
Sem ter nem leve sombra de avaria ;
No rude vozear d ' aquella gente ,
Que expansão de enthusiastica alegria !
Viva , saltando sobre a areia flava ,
Chega a todos a argentea pescaria !

Ao soar da buzina , dos casaes
Partem bestas de carga a toda a brida ,
Guisalhando atravez d ' esses juncaes .
Os cabazeiros , na afanosa lida ,
Avergados e a passo de balança ,
Jogam - se ao Monte , a governar a vida !


Costa da Caparica, Peixeiras, 1901.
Biblioteca Nacional de España

Ondula o mar azul . Cintra recorta
No chão do céo os picos elegantes .
Nos cachopos da barra , a vaga morta ,
Vem desfazer - se em frocos espumantes .
Ha nisto como um vago de alegrias . . .
Alegrias , visões de alguns instantes ! (2)



(1) O Antonio Maria, 1894
(2) Bulhão Pato, Paquita (2.a edição), Lisboa, Typographia da Academia Real de Ciências, 1894

Mais informação:
Marisa das Neves Henriques, Paquita

Leitura relacionada:
Bulhão Pato, Livro do Monte, georgicas, lyricas, Lisboa, Typographia da Academia, 1896

Tema:
Bulhão Pato

sábado, 19 de junho de 2021

Bulhão Pato por Raphael Bordallo Pinheiro em 1870

Agora temos o meu velho amigo Bulhão Pato em extasi poetico, esquecido da caça e ludibriado pelas perdizes e pelos coelhos e lebres em cuja perseguição saira a campo. Descobriu porventura alguma nova "flor agreste" e medita principiar por ella outro volume tão desejado pelos que leram o primeiro. Acaba gentilmente com esta caricatura o primeiro fasciculo da sua obra. (1)

Bulhão Pato por Raphael Bordallo, Pinheiro (1846-1905).
O calcanhar d'Achilles, album de caricaturas, 1870.
Museu Bordalo Pinheiro

Tem licença amplissima para publicar a minha caricatura.
Que ha n'ella d'offensivo?
Apenas uma coisa; mas essa é co 'a minha vaidade:
Quando o seu lapis me desenhou com a face esqualida, a mão espalmada, as pernas como dois finissimos floreies, quer-me parecer que fez mais um retrato do que uma caricatura.

Seja como for, acceite um aperto de mão agradecido do seu
Admirador o do seu amigo
Lisboa, Março de 1870

R. de Bulhão Pato (2)



(1) Teixeira de Vasconcellos, Raphael Bordallo Pinheiro, O calcanhar d'Achilles... 1870
(2) Bulhão Pato, Raphael Bordallo Pinheiro, O calcanhar d'Achilles - album de caricaturas, 1870

Artigo relacionado:
Retratos de Bulhão Pato

Leitura relacionada:
Raphael Bordallo Pinheiro, O calcanhar d'Achilles - album de caricaturas, 1870

Mais informação:
Museu Bordalo Pinheiro

Tema:
Bulhão Pato

quinta-feira, 17 de junho de 2021

Prosas do Monte

Logo com o romper do dia appareceu o nevoeiro. Em o mar reclamando, não nos bancos da Barra; mas nas arribas da Costa, com ruido constante, e que se assemelha ao parque d'artilheria rodando a distancia, é esperar pela "resposta" do nordeste. Não falha.

Retrato de Bulhão Pato por Columbano (detalhe), 1908.
MatrizNet

O vento parara completamente, e desde o nascer do sol o nevoeiro era cada vez mais denso. ]á 11 da manhã e não se via a dois metros.

Este anno as arvores principiaram a abrir muito cedo. Os paizagistas deviam apanhar o campo no primeiro balbuciar da primavera: tem o poder supremo e sobrehumano do crepusculo da adolescencia na mulher!

As cerejeiras mescladas de flor e de folhas, jogando. com os braços para o ar, tomam, algumas, a fórma de uma copa festonada e enorme. Variados, graciosos, encantadores quadrinhos! Os passaros não dobram o canto por agora; mas as cotovias matinaes, nas leiras de trigo temporão, andam aos pares. As andorinhas ha muito que se beijam voando, e o rouxinol, não tarda, no fechado dor pomares, a reclamar a amante.

O nordeste, annunciado pela bateria remota, começa correr. De subito rasga-se o véo sombrio do nevoeiro.

Trigaes das varzeas, silveiras dos vallados, vinhedos das encostas, alguns olmeiros aqui e além, tudo envolto por neblina transparente ern jubilo exuberante, parece pular da terra, como querendo fundir-se com o sol deslumbrador, que faisca na curva anil do firmamento purissimo!

Rompe a orchestra do tempo, — desespero dos contrapontistas — com as mesmas notas, as mesmas combinações, os mesmos motivos, e sempre nova, variada, original!

Não são as montanhas, as florestas, os valles, as cataratas, os promontorios, o mar com as tormentas!...

Retrato de Bulhão Pato por Columbano, 1908.
MatrizNet

São os assomos da primavera n'uma paizagem levemente ondeada; mas que imprevistos contrastes de harmonias, de luz e de côr! — As violetas, muradas, suspiram pela paixão sem macula; as rosas, provocadoras, mordem com os espinhos do ciume; os balsamos da aragem precipitam a circulação; a laranjeira, occultando na castidade branca das suas grinaldas o veneno do amor, seduz a virgem, a quem o bosque promete segredo e sombras; as papoulas, ebrias erguem a taça incendiada, convidando a lubricos combates; e a melros dissimulam, no madrigal improvisado, a satyra perfida!

O campanario do Monte repicou a casamento. Dois carros descobertos rodam em frente da minha janella. Regressam do adro da egreja. No trem, que segue adeante, a noiva, gesticulando alvoroçada, fala com o noivo, rapagão fero, mas acanhado.

Petulantes, como rebentam das cerejeiras os botões florentes, saltam da bocca vermelha e sensual da rapariga os primeiros beijos das nupcias.

Março 1897 (1)


(1) Bulhão Pato, Branco e Negro, semanário ilustrado n.° 91, dezembro 1897

Tema:
Bulhão Pato

sexta-feira, 2 de abril de 2021

Armeiro de Bulhão Pato

A anglomania não se apoderara do poeta, apesar da moda e da tradição, já antiga. A sua espingarda d'então era uma bella arma hespanhola de Eybar — canos de "herraduras" — como nelles se lia em lettras d'oiro, e oitavados até um terço. D'oiro era a mira, e com elle discretamente ornada na bôcca e em volta da fecharia [das platinas] . Nada de oriental nesta ornamentação sóbria — um filete apenas. 

Bulhão Pato por Alberto Carlos Lima (detalhe).
Arquivo Municipal de Lisboa

O guarda-matto [a fecharia] tinha mola de segurança. Elegante e solida, esta caçadeira havia dado as suas provas: a esse tempo entrara já em muitas batalhas, e pouco antes Lopes Cabral — um athleta — matou com ella, em um dia, na Gollegã, setenta e cinco codornizes!


A Eybar succedeu Paris, e a espingarda que lhe conheço em effectivo serviço, ha mais de vinte annos, é uma Gastine-Renette, do systema Lefaucheux, cinzelada e acabada com a maior perfeição. Arma fina e de preço.

Raimundo Bulhão Pato, Miguel Angelo Lupi, c. 1880
Imagem: ComJeitoeArte

Gastine-Renette é úm dos mais illustres entre os fabricantes d'armas contemporâneos. Foi o "Arquebusier" de Napoleão III, o seu fornecedor predilecto de armas de caça e de guerra.

No cabide de armas do poeta vêem-se mais duas — uma de fogo central, belga, e outra Flobert-Remington.

Traiçoeira esta ultima. — Como os machos d'arrieiro morde e dá couce! O cão levanta, e o tiro vem, ás vezes, também para a cara do atirador! Perigoso systema. (1)

Paisagens de caça: Raimundo António de Bulhão Pato, 1829-1912;
sel. textos, org. e notas Nuno Sebastião.
cf. Bulhão Pato, Paizagens, Lisboa, Rolland E Semiond, 1871;

capa de Raphael Bordallo Pinheiro.
Ribeira Seca

Um dia foi que o "lever de rideau" — o prologo — esteve quasi a ser a tragedia. A espingarda de Bulhão Pato — era a de Eybar — deixara-a elle ficar em Allemquer, onde fora caçar, e Cabral, que de lá a trouxera, mandou-lh'a na véspera. Cabral —um grande e experimentado caçador — era tudo quanto ha de mais cuidadoso; podia-se-lhe chamar sem "calembour" [trocadilho], o rei das cautelas. 

Mas uma vez, todos erram, e quando Bulhão Pato, que tinha o costume de dar um fogacho á espingarda, antes de principiar a atirar, o fez sem a menor desconfiança, porque nenhum dos pistons trazia fulminanie, d'um dos canos saiu incendiada a polvora solta, mas o outro disparou um tiro a valer! Encaramo-nos Todos... Estavamos [felizmente] illesos.

O que nos valeu loi o ter elle, também prudente, disparado, como usava sempre, por cima da borda.

Bulhão Pato, Rafael Bordalo Pinheiro,
Album Glórias, 1902
Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal

— Hein! disse o poeta — de que nós escapámos! Mestre Cabral d'esta vez esqueceu-se!


Uma arribada em calma branca, revista Serões (detalhe) 1907
Hemeroteca Digital de Lisboa


E foi este, em tantos annos, o único accidente. que teve assomos de gravidade. (2)



(1) Zacharias d'Aça, O Tiro Civil n.° 135, sexta-feira 1 de abril de 1898
(2) Zacharias d'Aça, O Tiro Civil n.° 137, domingo 1 de maio de 1898

Artigos relacionados:
Retratos de Bulhão Pato

Tema: Bulhão Pato

Informação relacionada:
Bulhão Pato, Zacharias d'Aça, O Occidente n.° 717, 30 de novembro de 1898
Bulhão Pato, Paquita, Typographia Franco-Portugueza, 1866
Bulhão Pato, Livro do Monte, georgicas, lyricas, Lisboa, Typographia da Academia, 1896 
Francisco Zacharias d'Aça, Caçadas portuguezas: paizagens, figuras do campo
Lisboa, Secção Editorial da Companhia Nacional Editora, 1898



quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

Sentinellas perdidas

Foram crescendo a par;
São irmãos, e do píncaro do monte,
Dominam, todo em circulo, o horisonte
Da Costa brava, e do sanhudo mar!


Sentinelas ou Guardas avançadas, Caparica, Falcão Trigoso, 1935.

Nas grandes invernias,
Sentinellas perdidas, dam signal —
Sempre alerta, n'aquellas serranias —
Ao remoto casal.
Nos silvos das frondeadas ramarias.
Que se approxima o furacão austral!


Junho, 96.


(1) Bulhão Pato, Livro do Monte, 1896

sábado, 20 de junho de 2020

Os noivos (último canto de Bulhão Pato)

«Se passares pelo adro,
No dia do meu enterro,
Pede á terra que não gaste
As tranças do meu cabello.»
Canção Popular.

I

A aldea é de pescadores.
Por essas costas do mar,
Quando as tormentas começam,
Aquillo é que é labutar!

Desenho da Costa antiga, autor António Lopes Martins, Col. Particular.
Rui Manuel Mesquita Mendes (fb)


Ás vezes um mez a fio,
O vento sem acalmar,
E os vagalhões dia e noite
Nas rochas a rebentar!

Algum remedio, e bem pouco,
Que tanto custa a juntar,
Pois basta um mez de invernia,
Nem tanto, para o levar!

Que vida a da pobre gente,
Quando começa a lutar
O vento bravó co'as ondas,
Por essas costas do mar!

II

Ha quatro casas e a ermida
De pedra e cal, o demais
Choças de colmo que ás vezes
Destroem os vendavaes.

Mas quando chega o bom tempo,
E a pesca não escaceia,
Respira toda alegria,
Apesar de pobre, a aldea.

Daniel é moço e forte; 
Ninguém com elle compete, 
Já no saber, já no arrojo 
Com que a todo o mar se mette!

Vê-se uma negra de peixe —
Ás vezes mal se tem visto: 
Lá vae co'a sua companha 
Por esses mares de Christo. 

Tem fé co'a Virgem do Amparo, 
E alguém diz qne a devoção 
É por ser Amparo o nome 
De certa rosa em botão. 

D'entre as demais raparigas 
Só ella não é trigueira, 
Também não se expõe ao tempo, 
Trabalha como rendeira. 

Lidar de noite e de dia, 
Com tanto affinco, é bem raro!
Esteio da mãe velhinha, 
Bem posto o nome de Amparo!

Daniel, n'aquella aldeia 
Onde o viver é tão parco,
Já tem um barco, e tem redes, 
Quo valem mais do que o barco.

III

A mutua affeição dos dois,
Que era na infância amisade,
Tomou-se em amor, depois
Que entraram em certa idade.

Elle quiz-se declarar,
E com voz entrecortada,
A custo poude fallar:
Ella é que não disse nada!

Sentindo agitado o seio,
Não raro diz a innocencia,
Com a mudez do receio,
Bem mais que a voz da eloquência!

Que importa o que os lábios calam,
Quando as palavras se prendem?
Também as flores não fallam,
E pelo aroma se entendem!

É que esse aroma, imagino
Que será, talvez, na flor
O mesmo effluvio divino
A que chamamos amor !

IV 

Amparo tínha no rosto
Uma expressão de ternura,
Que lhe dava mais encantos
Do que a própria formosura!

Os olhos azues purissimos,
E de transparência tal,
Que deixavam ler no fundo
Da sua alma virginal!

O cabello loiro-escuro,
Tão basto, tão annelado,
Que era um primor, posto em tranças,
É mn enlevo, desatado!

No tempo em que era creança,
E de génio folgasão,
Com as outras raparigas,
Pelas tardes de verão;

Andava a brincar na praia,
E a espreitar de quando em quando:
Os hombros nús, mais que os hombros...
Emfim, co'as ondas folgando.

N'isto vinham os rapazes
Mas o cabello era tanto.
Que sacudia a cabeça,
E servia-lhe de manto!

Ao amado da sua alma
Deu ella um dia, em secreto.
Um annel d'esses cabellos.
Penhor de sagrado affecto!

E elle, cheio de alvoroço,
Sem hesitar um momento,
Para pagar-lhe a fineza,
Foi pedil-a em casamento.

Fundíam-se aquellas almas
Em celestiaes alegrias:
Ha dias do ceu na terra!
Eu creio que ha d'esses dias!

V

Uma tarde, era nas vésperas
De se fazerem as bodas,
Os pescadores na costa
Largavam as redes todas.

O ceu estava sereno;
Era propicia a estação:
Logo em entradas de outono,
Dias como de verão.

Porém o vento levanta-se!
E quando menos se espera.
Seja verão, seja outono,
Seja inverno ou primavera.

Daniel, deixando os outros,
Com a companha a seu cargo,
Fez-se ao mar, largando as artes
A duas léguas de largo.

O peixe dava em cardumes;
Lidando não attentaram
No aspecto de certas nuvens
Que no ceu se agglomeraram. 

Dentro de pouco os relâmpagos
Nos ares a fuzilar,
E o vento a picar as ondas,
E as ondas a rebentar!

Podiam correr á popa,
Mas não sem todo o cuidado,
Que á popa, em caindo tempo,
É navegar arriscado.

A vela posta nos rizes
— O vendaval carregava —
Como um falcão corta os ares,
O barco as. ondas cortava!

Amparo, sobre um penhasco.
De mãos. postas a resar:
A morte no arfar do seio,
Ancias de morte no olhar

Elles já perto da costa,
E o povo junto a dizer:
«Se o barco vem aos cachopos
Só Deus lhes pode valer!»

Tentaram fazer-se ao largo,
Luctando co'a morte a braços;
Mas deram sobre os rochedos,
E o barco fez-se em pedaços!

Salvou-se toda a companha.
Daniel inda se ouviu 
Bradar: — «Ó Virgem do Amparo!»
E nisto não mais se viu...

A noiva soltara um grito;
Mas quem lhe fôra acudir,
Vira-lhe o rosto sereno,
E até a bocca a sorrir!

Aquelle grito estalara-Ihe
As fibras do coração
E a infeliz, nesse momento,
Tinha perdido a razão!

VI 

Passados dias, Amparo
Puiha-se á beira do mar,
A olhar — como quem espera
Por alguém que hade voltar!

E os que passavam ouviam-lhe,
Sem que ella desse por tal,
Repetir estas palavras
D'uma tristeasa mortal:

«Devem cumprir-se os pedidos
D'aquelles que vão morrer;
Uma só coisa te peço,
— Mas que tu me has de fazer:

«Se passares pelo adro.
No dia do meu enterro,
Pede á terra que não gaste
As tranças do meu cabello.»

E depois, soltando as tranças
A larga brisa do mar,
Repetia inda estes versos,
E desatava a chorar!

Janeiro, 1871 (1)


(1) Bulhão Pato, Cantos e satyras, Lisboa, Rolland & Semiond, 1873

terça-feira, 16 de junho de 2020

Bulhão Pato pelo visconde de Benalcanfôr


N'um esboço tocado de traços fugitivos não cabe de certo a minucia demorada, mas indispensavel no retrato para a semelhança perfeita das feições e das physionomias. Por mais sobrio de divagações que seja o escriptor, torna-se-lhe muito difficil, senão impossivel, contrahir na tela acanhada de um capitulo as magestosas ondulações de uma corrente de poesia que ha vinte e quatro annos* despraia pelas margens da nossa litteratura depon do n'ellas o nateiro abundante e riquissimo de suas creações poeticas.

Bulhão Pato (1828-1912)
(insp. Andy Warhol, Ten Lizes, 1963)

* Data de 1850 a apparição das primeiras poesias de Bulhão Pato. Seguem-se-lhe em 1857: Amor virgem n'uma peccadora, comedia-drama em um acto, prosa e verso 1862 ; Versos , 1 vol .  1864 : Digressões e novellas , 1 vol . , e Graziella , versão de Lamartine 1866 : Paquita ( poema ) , 1867 ; Canções da tarde , 1 vol . - 1869 ; Flôres agrestes , 1 vol .  1871 ; Paisagens ( prosa ) , 1 vol , 1873 ; Cantos e satyras , 1 volume. Editores , Rolland e Semiond , 1873, Lisboa ; Renan e os sabios da academia ( satyra ) , O cemiterio de Pisa , e a Vendetta , versões de Emilio Castellar , e de Balzac.

De feito , a indole primordial e as evoluções subsequentes do talento de um escriptor ou de um poeta qualquer , teem mais do que affinidade remota com as nascenças de um rio. Como este , o talento tambem brota modesto de suas origens , e engrossa depois a sua corrente , já derivando se reno , já correndo agitado , ora apertando-se em voltas caprichosas , ora alargando seu alveo e rolando magestoso até se metter no oceano ordinariamente tempestuoso da fama litteraria . Porque é que , aos 19 annos , apaixonado e ter no como um trovador , com a bocca ainda humida do ultimo beijo , a mente escandecida por visões encantadas e por sonhos voluptuosos que — sómente a aurora desfaz arroxeando o horisonte , para voltarem na noite immediata , — canta os amores juvenis , com seus enleios e suas malicias tam bem ?

Porque scisma dôcemente Bulhão Pato vendo os lirios e as boninas em que pousa o orvalho das manhãs de abril ? Porque aspira com embriaguez o aroma dos campos ? Porque escuta os mil rumores mysteriosos do bosque ? Porque se fica esquecido a contemplar as nuvemsinhas do poente e as sombras melancolicas do crepusculo da tarde ? E porque é tambem , que passados vinte annos , vêmos o mesmo poeta , outr ' ora rescendente das essencias mais fragrantes do lyrismo , despedir-se , pelo menos momentaneamente , das canções amorosas , arrancar as cordas do seu alaúde romantico para pulsar a lyra fremente da indignação vingadora de Juvenal , de Augusto Barbier e de Victor Hugo ?

É facil conciliar esta contradicção apparente , pois não é senão uma phase natural de sua indole poetica , lembrando-nos de que Bulhão Pato é um poeta essencialmente espontaneo ; que a sua poesia é o reflexo fiel da sua alma . Suas canções risonhas como uma alvorada de maio quando as illuminava o sol da primeira mocidade , assumiram nas satyras já a gravidade das paisagens severas , já o aspecto tragico das cataratas que se despenham no inverno com medonho estrepito , ou o das noites de procella cuja escuridão é apenas alumiada pelo fulgor livido dos relampagos.

É que a doçura das illusões juvenis cortou-lh'a o travo das decepções ; é que aos idyllios descuidosos da manhã da vida seguiu-se , no poeta , o drama viril da existencia com o seu cortejo de lutas , e de paixões acerbas.

Foi este pendor natural por onde o poeta foi levado das regiões tranquillas da poesia individual e lyrica aos espaços tempestuosos da poesia social e da satyra politica , aonde as coleras , os resentimentos e até as proprias aspirações do poeta , ou antes do partidario , é inevitavel que tumultuem com o fragor e a espuma das ondas irritadas. Se a Nemesis politica pode ser , como é sempre nas satyras de Bulbão Pato , elevada , decorosa e elo quente , nem por isso está isenta , em outros poe tas contemporaneos , das allucinações do furor , e dos rebates rancorosos.

Poeta de verdade , fiel ás vozes interiores da consciencia que o chamam a combater por uma causa em que vê o triumpho da justiça , ou a fulminar os que se lhe afiguram vicios e hypocrisias sociaes com os seus terriveis alexandrinos , verda deiros raios despedidos pela mão de Juvenal , Bulhão Pato é tão espontaneo e sincero hoje na explosão das paixões , que o abrazam , como o era d'antes nas effusões do seu adoravel lyrismo.

A sua musa , agora como sempre , não se envolve em roupagens theatraes , nem carece de lentejoulas para nos seduzir com os seus encantos . É essencialmente singela , desaffectada , natural . O seu culto é o do bello , idealisado pela arte . Se algumas superstições alimentar , como todos os cultos , serão as da sinceridade dos sentimentos , da espontaneidade das impressões.

Será esta a ultima e definitiva phase do seu talento poetico , affirmado por tantos monumentos , em que a sua phantasia ao mesmo tempo vigorosa e delicada gravou as suas creações como os esculptores mais afamados gravaram com o cinzel as suas no marmore antigo mais puro ?

Não o acreditamos . A natureza com as suas vozes mysteriosas ; o coração humano com os seus enleios , esperanças e amarguras ; os mil dramas commoventes da existencia ; as subtilezas e os arcanos psychologicos da alma ; as tragedias moraes da paixão , em que gemem e succumbem , duramente suppliciados , os affectos mais intimos ; eis a tela larga e permanente em que hão-de voltar a embeber-se as côres da palheta opulenta e admiravel do nosso eminente poeta . Ainda bem , que as apostrophes e as coleras partidarias são apenas na vida social , e na littera ria tambem , um ephemero accidente.

Especie de relampagos que atravessam a atmosphera , sua claridade é momentanea , como momentaneo é tambem o ribombo do trovão que os acompanha.

Afastados os negrumes da procella , o céo recobra a antiga transparencia etherea , semelhante á superficie azul de um lago immenso que nenhuma aragem encrespa.

Quaes são as feições salientes do genio poetico de Bulhão Pato ? a imaginação , a sensibilidade , a perfeição inimitavel da fórma , e o gosto sem igual.

Em todo o poeta , que o é deveras , ha forçosamente a coexistencia da imaginação , que cria as ficções , as scenas , os personagens , com a sensibilidade que o domina , antes de nos commover , e com a melodia do rythmo cujas cadencia , sonoridade ou valentia formam a linguagem sublime da linguagem da poesia . A todo este conjuncto feliz de qualidades devem presidir as leis soberanas do gosto que lhe dão relevo , vigor , graça e harmonia.

Quando o poeta melodioso da "Harpa do crente" e da "Voz do propheta" [Alexandre Herculano] escreveu no prologo da Paquita que "Bulhão Pato é sobre tudo um homem de gosto e que o homem de gosto é sobre tudo singelo" , resumiu n 'um traço a physionomia inteira do author dos Cantos e satyras.

Alexandre Herculano (1810-1877).
Retrato por Francisca de Almeida Furtado, 1852.
 MNAA, Obras em reserva, O museu que não se vê.

Adivinha-se n'elle a sua predilecção pela singeleza de Garrett , desespero de tantos que inutilmente a teem procurado na poesia e na prosa . Nas "Digressões e novellas" , bem como nas "Paisagens" , digamos , ha contos e episodios narrados e descriptos com tal suavidade de linguagem e tal frescura de tintas , o colorido é ao mesmo tempo tão sobrio e acertado , a trama da prosa tão finamente tecida , o dizer tão caloroso e casto , que acabando de lêr aquellas paginas , nos sentimos consolados , não só com a certeza de não haver desapparecido com o visconde d'Almeida Garrett o estylo elegante , singelo e sobrio das Viagens na minha terra , mas até de o vêrmos luzir na simplicidade das suas roupagens , tão animado como d'antes , flexivel , eloquente.

Voltando á sua poesia , podemos dizer que Bulhão Pato canta suavemente , ternamente , quer o enlevem as scenas da natureza , quer o commovam as dôres profundas ou as miserias dilacerantes dos supremos infortunios . Nas cordas da sua lyra resốam-lhe espontaneos os canticos , como o vento na harpa eolia , desferindo por si mesma as notas e as estrophes . A melodia , a tristeza e o amor divagam pelas cordas do seu alaúde como o luar de uma noite de outono pelas campinas , avel ludando - as com sua doce e pallida claridade.

O seu ideal poetico nem é o naturalismo exagerado de Goethe  nem a ironia desesperada de Byron. 

Respira-se nos seus poemas o perfume do lyrismo de Garrett e de Lamartine , interrompido a espaços pela toada doudejante de Musset , mas illuminado e aquecido pelas chammas do sol da peninsula que lhe dourou o berço.

Almeida Garrett (1799-1854)
Retrato por Manuel Araujo Porto-Alegre, 1833.
Instituto Camões

Abundam na harpa do poeta as notas sentidas da elegia , e alguns dos seus poemetos , entre elles a "Rosa do monte" e "Os Noivos" , são deliciosos pelo interesse dramatico que os anima , pela paixão intensa que respiram e pela perfeição dos moldes poeticos.

Em ambas estas composições, admiraveis de fórma , o poeta elevou-se á mais alta sensibilidade, orvalhando-as de lagrimas e commovendo-nos. Que sobriedade de traços na pintura da aldea, nos Noivos, e que sympathia contagiosa pela vida aspera dos pobres pescadores !

A aldea é de pescadores .
Por essas costas do mar ,
Quando as tormentas começam ,
Aquillo é que é labutar !

Ás vezes um mez a fio ,
O vento sem acalmar ,
E os vagalhões dia e noite
Nas rochas a rebentar !

Algum remedio , e bem pouco ,
Que tanto custa a juntar ,
Pois basta um mez de invernia ,
Nem tanto , para o levar !

Que vida a da pobre gente ,
Quando começa a lutar
O vento bravó co ' as ondas ,
Por essas costas do mar !

Ha quatro casas e a ermida
De pedra e cal , o demais
Choças de colmo que ás vezes
Destroem os vendavaes.

Mas quando chega o bom tempo ,
E a pesca não escaceia ,
Respira toda alegria ,
Apesar de pobre , a aldea.

A pintura da noiva de Daniel, o arrojado pescador , é um modelo de poesia, e de naturalidade, em que se reproduzem as altas faculdades do poeta, a imaginação viva, a singeleza graciosa, a ternura tocante e o atticismo da fórma :

Amparo tinha no rosto
Uma expressão de ternura ,
Que lhe daya mais encantos
Do que a propria formosura !

Os olhos azues purissimos , 
E de transparencia tal , 
Que deixavam lêr no fundo 
Da sua alma virginal ! 

O cabello louro - escuro , 
Tão basto , tảo annelado , 
Que era um primor , posto em tranças , 
E um enlevo , desatado !

No tempo em que era criança 
E de genio folgazão , 
Com as outras raparigas , 
Pelas tardes de verão , 

Andava a brincar na praia , 
E a espreitar de quando em quando 
Os hombros nús , mais que os hombros . . . 
Em fim co ' as ondas folgando.

N ' isto vinham os rapazes — 
Mas o cabello era tanto , 
Que sacudia a cabeça , 
E servia - lhe de manto !

E que vêa dramatica lateja na rapida scena do temporal que de repente se levanta !

O céo estava sereno ; 
Era propicia a estação : 
Logo em entradas de outono , 
Dias como de verão. 

Porém o vento levanta - se 
E quando menos se espera , 
Seja verão , seja outono , 
Seja inverno ou primavera.

Daniel , deixando os outros , 
Com a companha a seu cargo , 
Fez - se ao mar , largando as artes 
A duas leguas de largo. 

O peixe dava em cardumes ; 
Lidando não attentaram 
No aspecto de certas nuvens 
Que no céo se agglomeraram. 

Dentro de pouco os relampagos 
Nos ares a fuzilar , 
E o vento a picar as ondas , 
E as ondas a rebentar !

Podiam correr á pôpa 
Mas não sem todo o cuidado 
Que á pôpa , em cahindo tempo , 
E ' navegar arriscado. 

A véla posta nos rizes — 
O vendaval carregava — 
Como um falcão corta os ares , 
O barco as ondas cortava ! 

Amparo , sobre um penhasco , 
De mãos postas a rezar : 
A morte no arfar do seio , 
Ancias de morte no olhar.

Elles já perto da costa , 
E o povo junto a dizer : 
« Se o barco vem aos cachopos 
Só Deus lhes póde valer ! » 

Tentaram fazer - se ao largo , 
Lutando co ’ a morte a braços ; 
Mas deram sobre os rochedos , 
E o barco fez - se em pedaços !

Com que saudade nos apartamos dos vergeis amenos , das solidões melancolicas ou das campinas risonbas por onde divagam alternadamente os folgares e as tristezas do seu lyrismo , lagrima crystallina em que por instante brinca um raio de sol !

Com que pena dizemos adeus aos lagos transparentes em que o vêmos espanejar suas azas brancas de cysne , para seguirmos embora por poucos instantes o poeta ás regiões tempestuosas da satyra , onde os jambos de Archilocho fuzilam como raios por entre as nuvens negras de procella e os alexandrinos esplendidos do nosso poeta ullulam , encapellando - se , como vagas enfurecidas , e possessas do demonio da tormenta !

Ouçam esse brado , em que renascem as mofas e o desprezo de Juvenal :

Lá vai correndo as ruas da cidade , 
A quatro , um titular da grande sociedade . 
Que apparatoso trem , que fardas d ’ espavento ! 
Pasma o futil vulgacho em face do portento ! 
Quem é ? sabem quem é : conhece - o todo o mundo : 
Um nobre , um par do reino , um sapo nauseabundo , 
Que á plena luz do sol , viscoso e repellente , 
Ou na praça ou na rua enoja a toda a gente ! 

Este illustre varão , poço de iniquidades , 
Tem — faculta - lhe a lei — varias immunidades : 
Póde até legislar ! ó povo desgraçado , 
Decide - te da sorte o voto d ’ um forçado , 
Que , se houvesse moral , já não seria estranho 
Vêl - o com a braga ao pé a trabalhar no banho !

A satyra que tem por titulo "Dalila" reune , a meu vêr , quantos predicados se exigem da satyra , para que ella nem na grandeza , nem na magestade , nem na eloquencia , nem na indignação , nem na ironia , desça das alturas em que deve pairar , sob pena de deixar de ser à musa terrivel do sarcasmo e transformar - se na collareja desbragada e plebêa dos mercados.

Este é o perigo supremo , a catastrophe séria que ameaça a maior parte das imprecações poeticas da actualidade . A satyra ha - de ser mais do que um aggregado de epithetos deprimentes e de injurias villăs , embora ligados n ' um feixe poetico pelo laço prestigioso de um rythmo sonoro e opulento.

É preciso sobre tudo que a satyra não perca nunca a elevação da idéa , a finura subtil da analyse , o cambiante feliz e inesperado nos traços incisivos e rapidos das suas ironias e que a colera , que a domina , não a afunde no charco das obscenidades grosseiras nem a rebaixe ás indecencias avinhadas de uma bacchante meio despida.

Eis um trecho da satyra a que nos referimos :

Que singular mulher ! 
que estranha formosura ! 
Tem tudo — o andar , o gesto , a graça da figura ! 
No purissimo azul dos olhos crystallinos 
A luz que nos transporta aos extasis divinos . 
Casando - lhe a altivez co ’ a timida innocencia , 
Deu - lhe ao rosto o ideal a mão da Providencia. 
O devoto dirá , vendo - a rezar no templo : 
« Não pode ser do mundo aquella que eu contemplo ; 
Se és anjo implora a Deus o bem da humanidade ! » 
Tal assombro produz a magica beldade !

Pois bem , esta mulher — mulher unicamente — 
Enreda , calumnia , infama a toda a gente.
No livro de orações á margem tem marcado 
O dia da entrevista , o ponto combinado. 
Uma vez escondeu , por ser o caso instante , 
No berço d ' uma filha as cartas d ’ um amante. 
Profanando , sem alma , o coração do lar , 
Profana tudo mais : a prol ' , o templo , o altar ; 
Mas como entra no mundo apparatosa e rica , 
Co ' as virtudes da santa o mundo se edifica !

Esta magnifica satyra , recheada , como vêem , de contrastes felizes , de antitheses de hypocrisia e de devassidão , de perfidia e de cynismo , prosegue sempre variada nos tons , acertada nos cambiantes e nas gradações . Na ultima parte d'ella , o poeta figura uma infeliz trahida nos seus amores pelo homem de quem teve uma filha . A sociedade mostra - se indifferente a tão grande infortunio.

Perante este egoismo revoltante do corpo social o poeta exclama :

O mundo que applaudiu as galas deslumbrantes 
Da perfida ao marido e perfida aos amantes 
Co ' a implacavel moral que inflamma a gente séria 
Desampara a infeliz prostrada na miseria.

Bemdito seja Deus ! — os que mais fazem d ' isto 
Andam sempre a invocar teu santo nome , ó Christo. 

A moralidade que respira esta composição , o caracter impessoal com que fecham estes versos esplendidos , irreprehensiveis , aonde , além do ar tista que inventa , ha o lapidario paciente que pule os prismas do diamante , o Benvenuto Cellini que lavra com um buril privilegiado e unico os pri mores da phantasia , tornam admiravel a satyra de Dalila ; e provam a elevação artistica a que póde attingir , nas mãos de um poeta eminente e sabedor da arte , um genero aliás tão perigoso e cercado de precipicios.

As suas satyras , até hoje publicadas , respiram pela maior parte a punição das apostasias e a au dacia generosa das aspirações da liberdade , sem os doestos e as represalias sanguinolentas que ge ralmente , seja qual fôr o paiz e o talento do es criptor , salpicam a satyra , e por vezes a fazem rojar pelos tremedaes , desgrenhada , odienta , plebêa.

Quando nos lembra que Barbier , o notavel e fogoso poeta , que em plena monarchia de julho fez lampejar em todo o seu fulgor os raios da satyra antiga , descrevia a liberdade como uma mulher robusta ,

Qui ne prends ses amants que dans la populace 
Qui ne prête ses larges flancs 
Qu ' a des gens forts comme elle , et qui veut qu ' on l ' embrasse 
Avec des mains rouges de sang , 

e se extasiava com o fanatismo servil de um li berto de Claudio diante das escorias sociaes , ani . madas de odios profundos ás quaes elle chama

La grande populace et la sainte canaille 

é facil prever a quantas aberrações , a quantos desregramentos póde arrastar , quando manejada por mãos imprudentes ou inhabeis , esta arma litteraria em que , se por um lado , respiram as paixões nobres e viris , por outro fermentam , não raro , os sentimentos baixos , as vinganças biliosas , e a licença deshonesta das maximas torpezas.

Ainda bem que a satyra de Bulbảo Pato é sempre elevada . Que outros não a prostituam aos convicios das encruzilhadas e não a manchem com o lodo das infamias partidarias , é o nosso voto mais sincero.

Oxalá que não se vulgarize um genero litterario que , pela sua mesma natureza , não pode ser na arte senão uma manifestação excepcional , tendo - se em conta a exaltação febril e as paixões acerbas , necessarias para a sua gestação , e de que ella vive infelizmente como da sua vida natural e permanente.

Sente - se porém admiração espontanea , irresistivel , bemdiz - se até o jambo de Archilocho e o latego de Juvenal , quando n ' elles trôa a eloquencia vingadora de "Victor Hugo no Calvario" , e da "Velhice do Seculo" . É que então a arte reveste - se , deslumbrando - nos , de todos os esplendores das auroras boreaes.

Quando a musa sobe tão alto na indignação e na eloquencia , e dos seus pincaros de luz e de chammas , ao mesmo tempo magestosa e terrivel , dardeja raios ardentes , que alumiam e abrazam quanto tocam , a grandeza solemne da scena asso berba o espectador , e subjuga - lhe por tal forma as faculdades da analyse e da critica , que estas co mo que se paralysam , para só viverem as do en thusiasmo e as da admiração.

Ouçamos o poeta [cf. Victor Hugo no Calvario ( Cantos e Satyras ) , pag . 160]:

Já um dia em Paris a honrada burguezia 
Fraternizou tambem co ' a santa clerezia , 
Protegeu a matança , e depois d ' esso horror 
Assentou sobre o throno um certo imperador. 
Veio à paz , engordou - - embora amordaçada , 
— O clero a dominar a plebe fascinada ; 
Nos campos a nudez , nas côrtes a opulencia ; 
Os excessos do luxo a darem na demencia ; 
Censura ao pensador , licença ao imbecil , 
Ao zombeteiro estulto , ao escriptor mais vil . 
Que succedeu depois ? - o tronco derrancado 
O fructo que produz é fructo desgraçado.

O direito era a força , e julgando - a tamanha 
Claudio ousou provocar os brios da Allemanha . 
O clero abençoava o protector de Roma : 
Rugia o seu leão e sacudia a coma . 
De repente a panthera atira - se ao leão , 
Mas encontra na garra um Cesar charlatão.

Não podem apagar - se versos como estes . Fundidos em bronze , teem a solidez e hão - de ter a duração e o relevo das moedas e das estatuas d ' aquelle metal . A posteridade ha - de sentir para estas composições a mesma admiração que sente para as satyras de Persio e de Juvenal , de Barthelemy e de Augusto Barbier ; porque nas satyras de Bulhão Pato fundem - se com primor igual a grandeza e a elevação da invectiva na pureza inexcedivel , perfeitissima do rythmo , — nos mais sonoros e va lentes alexandrinos , em que pode esculpir - se a linguagem de um poeta portuguez.

Troveje elle muito embora na satyra e folgue , por momentos , de sé nos revelar por entre os fulgores do raio e o graniso de fogo dos coriscos dos seus alexandrinos ; mas , por Deus lh ' o pedimos , não se despeça das regiões do seu lyrismo encantador. 

Não diga para sempre adeus á musa travessa e de vaneadora da Paquita , — d ' esse poema que lhe con quistou os fóros de eminente poeta , — d ' esse poema , que é um monumento indestructivel como já é também o tormento dos seus detractores ; por que bem sabe elle que a corôa da gloria litteraria é desgraçadamente cravada , por dentro , dos espinhos da inveja , que , por baixo das folhas de lou ro estão de continuo ensanguentando a fronte dos infelizes que a cingem!

Em resumo : eloquente , magestoso , por vezés terrivel , vibrando o sarcasmo , manejando a iro nia , nunca descahindo nas vulgaridades grosseiras , nem se atolando nos paúes da injuria torpe ( escolho dos talentos pouco delicados que confundem o vo zear das feiras com as imprecações nobres ) , Bulbão Pato sabe dar ás suas satyras as mais altas condições de decoro , de pudor , e de grandeza , de que é susceptivel esta fórma de poesia.

As suas invectivas teem a magestade classica . Assumem proporções epicas , os sacrificios , as he catombes , em que supplicía as suas victimas . Inspiram - no porém , sem nunca o desamparar , senti mentos nobres , propositos generosos , amor arden te da justiça , da liberdade , do progresso humano e social.

É por isso que , percebendo as intenções puras do poeta , sem desconhecermos as exagerações a que aliás póde levar tal genero de poesia , o applaudimos por esta brilhantissima manifestação do seu talento , onde alcançou victoria não menos assignalada e decisiva do que nos canticos da poesia lyrica , nos carmes da elegia , e principalmente nas ficções graciosas da Paquita , em que com felicidade summa seguiu entre nós as pisadas do Ariosto e de Casti , affirmando sempre a sua individualidade.

D'essa Paquita , de quem o snr. Alexandre Heculano escreveu "que a amou desde o berço porque representa na litteratura actual uma res tauração , e nega um progresso: restauração santa e progresso mentido", esperamos com avidez que não se demore a contar-nos o seguimento das aventuras que correu com o seu Pepe.

Está a pular-nos na memoria a lembrança d'aquella ermida, em que ao repontar do sol nos outeiros, Angelita se encontra com Pepe, enleados de se verem aquella hora da manhã. E o pasmo de Pepe quando em sitiaes ouve que Angelita pretende casal-o ? E a ingleza que n'esse momento se aproxima dos dous ? E as questões acaloradas entre o marido de Herminia e o da consuleza ? E o desafio dos dous apaziguado pelo mofino do Pepe, cujos amores esvoaçam sobre as tres adoraveis creaturas que o cercam, como borboletas sobre flôres ? E aquella walsa do baile, cuja descripção tem a vi vacidade calorosa da do Amaury ? E a viagem da despeitada Herminia para Athenas ? a febre mortal de Pepe quando se vê abandonado por ella ? a solicitude de Angelita correndo de noite a visitar o joven andaluz moribundo ? e o encontro d'ella com a formosa Adelina, a ingleza dos olhos azues, junto do leito do enfermo ?

Quando nos ha-de elle desenvencilhar toda esta meada intrincadissima ?

Ricardo Augusto Pereira Guimarães (1830-1889), Visconde de Benalcanfôr.

Os lances enredam-se alli n'um tal labyrintho vertiginoso de aventuras, de malicias, d'enganos, de paixões, que só poderemos alcançar o fio de Ariadna na continuação do poema, de que o author (esperamol-o ) não abrirá mão, sem primeiro satisfazer a nossa curiosidade, rematando ao mesmo tempo o monumento da sua gloria de poeta, monumento que ha-de avultar para o futuro entre os mais bellos e originaes da nossa poosia contemporanea. (1)


(1) Ricardo Augusto Pereira Guimarães, Phantasias e escriptores contemporaneos, 1874

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