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quarta-feira, 8 de junho de 2016

Colégio do Menino Jesus (1876 - 1901)

In Memoriam: Henry Bailey Maria Hughes (1833 — 1887)

Costa da Caparica, Manhã na praia da Caparica, Adriano Sousa Lopes (1879 — 1944).
Imagem: MNAC (museu do Chiado)

Ao norte lá está a egreja, simples e singella, como são também os costumes d’aquella boa gente hospitaleira, e ao lado da capella, mas mais para nor-noroeste., o chamado convento, onde está aula, mandado construir em 1870 pelo reverendo padre Hughes [...]

Costa da Caparica, em segundo plano o Colégio do Menino Jesus e a igreja, década de 1900.
Imagem: Arlindo Pereira

Estava então na Costa o reverendo padre Hughes, e o Tio Alfama, que pelos modos lhe pesavam na consciência uns certos e determinados peccaditos, procurou este ver o sacerdote para que o ouvisse de confissão.

Costa da Caparica, 1907.
Imagem: Delcampe

É então desde essa data que aquelle homem começa a derramar sobre a povoação da Costa benefícios sem número. (1)

O reverendo padre Hughes  é um sacerdote cujo único defeito conhecido é julgar-se no tempo do imperador Décio, o furioso perseguidor da cristandade, duzentos anos depois de Cristo.

Confundindo o Sr. Fontes Pereira de Melo com o temível imperador romano, o reverendo Huggs fêz como S. Paulo o Eremita: fugiu da comunicação dos homens, do Chiado e do Diário de Notícias, sacudindo as suas sandálias no Atêrro; e, não tendo à mão o deserto da Tebaida, tomou o vapor de Cacilhas, e foi estabelecer na outra banda a sua cabana anacoreta.

in Ortigão, Ramalho, As Farpas, Volume 5, A Religião e a Arte, Lisboa, David Corazzi, 1888

Conquanto Costa de Caparica seja a mais nova Freguesia do concelho de Almada [em 1973], pode e deve-se orgulhar de ter sido das primeiras terras de Caparica a ter uma escola primária. Pois ela apareceu em 1876, mercê da iniciativa do Reverendo Padre Henrique Bailie Hughes.

[...] Ramalho Ortigão, em um dos seus livros [As Farpas, A Religião e a Arte], embora a ele se faça larga referência, não nos diz que o Padre Hughes e não Huggs, como ele escreveu, com o castigo que lhe foi imposto, deu motivo a que fosse o principal obreiro da instrução primária em Costa de Caparica.
Então tivemos notícias dele no Colégio Dominicano de Lisboa, onde, depois de completar o curso que estudou, se tornou professor.

Durante esta parte da sua carreira diz-se que objectou a ordenação de um candidato a padre argumentando publicamente em resposta à questão da capacidade deste durante o serviço.

Com isto criou inimigos, e estando em perigo de vida, encondeu-se entre a população marítima de Lisboa, trabalhando com grande esforço na salvação destes, por quem era muito amado.

in The TABLET: The Island Recluse

Junto do local onde se encontra a actual Igreja, que nesse tempo se dizia Capela, existiu um vasto edifício Casa de Repouso (?) ou Convívio para reunião e meditação dos habitantes dos conventos que existiam em Caparica, edifício esse que mais tarde passou a ser escola primária e centro religioso — e nunca convento, como o povo erradamente lhe chamou, e ainda hoje é conhecido o local.

Costa da Caparica, Colégio do Menino Jesus dito "convento", imagem estereoscópica (detalhe), c. 1900
Imagem: Arquivo Municipal de Lisboa

O Padre Hughes, foi pelo seu dinamismo. o fundador do Colégio do Menino Jesus, cuja imagem se encontrava à entrada da escola, e da qual existe imagem igual mas de tamanho reduzido na igreja da Costa de Caparica, a que o povo chama o Menino Jesus da Praia por ter na mão uma rede a que os pescadores chamam ganha-pão ou chalavar, como ainda hoje se usa em determinadas pescarias.

Menino Jesus, madeira policromada, José Risueño, séc. XVIII.
Imagem: V&A

Desse colégio que existiu até 1901, foram seus professores, José Reis, Pedro Nolasco de Oliveira, José Lima, Francisco e António Calderon. Conquanto se diga que outros foram lá também professores, a verdade é que só estes figuram na Relação do Colégio do Menino Jesus da Costa de Caparica.

Costa de Caparica, Alberto Carlos Lima, colégio do Menino Jesus e casas típicas de pescadores, década de 1900.
Imagem: Arquivo Municipal de Lisboa

Assim como também é possível que outros padres tivessem lá passado como directores da escola, mas a Relação apenas nos fala além do padre Hughes, dos Reverendos Padres António Rodrigues de Campos e Patricio Russuel [Patrick Bernard Russell ou Patricio Bernardo Russell], além do Irmão Laico Frei Martinho José Nogueira.

Esta escola, que era apenas para rapazes, chegou a ter em aula mais de meia centena, o que era muito para a época.

Costa da Caparica, crianças filhas de pescadores, 1938.
Imagem: Arquivo Nacional Torre do Tombo

Até à data, que se saiba, ainda não se conseguiu localizar onde se encontram enterrados os restos daquele que foi o pioneiro da instrução primária em Costa de Caparica.

Costa da Caparica, Areal, Adriano Sousa Lopes (1879 — 1944).
Imagem: MNAC (museu do Chiado)
Hughes, Henry Bailey (1833 — 1887), padre católico romano; nascido em Caernarvon [hoje Caernarfon, país de Gales] em 1833, onde o seu pai, Howell Hughes, foi cura e depois reitor de Trefriw (1833 — 1839), e de Rhoscolyn, Anglesey (1839 — 1848).

Henry Bailey Hughes entrou para a Igreja Católica Romana, quando tinha cerca de dezesseis anos.

Estudou no Colégio Dominicano de Lisboa e, depois de entrar no sacerdócio, viajou em missionário na Europa, África e Estados Unidos. 

De regresso ao País de Gales, viveu por uns tempos na ilha de S. Tudwal, ao largo da costa Caernarvonshire, tendo pregado em Llyn e outros lugares de Caernarvonshire.

Escreveu hinos galeses e baladas. Faleceu a 16 de dezembro de 1887.

in Welsh Biography Online

Costa da Caparica, 1907.
Imagem: Delcampe

Dele apenas existe um ou outro apontamento dispersos em livros ou jornais e a recordação do povo com que ele passou à história: — o Monge da Costa! (2)

Costa da Caparica, pescadores octogenários, 1938.
Imagem: Arquivo Nacional Torre do Tombo


(1) Júnior, Duarte Joaquim Vieira, Villa e termo de Almada: apontamentos antigos e modernos para a história do concelho, Typographia Lucas, Lisboa, 1896.

(2) Correia, António, Divagando sobre Caparica: pedaços da sua história, Almada, edição do autor, 1973.

Artigo relacionado:
A costa no século XIX


Leitura adicional:
The TABLET: Et Cietera
The TABLET: The Island Recluse

segunda-feira, 6 de junho de 2016

A Costa no século XIX

"Deverá o velho morrer sozinho, irmãos? Deverá o velho morrer sozinho?

Não haverá homens na cristandade, para reunir em volta de seu trono?

Não haverá mãos esquerdas para agarrar a espada dos heróis que partiram [...]"

O autor, padre Hughes, foi um galês que em 1860 ofereceu os seus serviços ao Patriarca de Lisboa para evangelizar a então totalmente negligenciada costa de Caparica, a sul do Tejo.

Não só encorajou e inspirou os moradores, como lhes construiu a igreja e, também, realizou um grande trabalho social com a plantação de eucaliptos e pinheiros ao longo de quilômetros de areal, livrando assim a região da febre dos pântanos. (1)

Costa da Caparica, Colégio do Menino Jesus dito "convento", imagem estereoscópica (detalhe), c. 1900
Imagem: Arquivo Municipal de Lisboa

Refira-se que a Costa de Caparica só começou a ser ocupada a partir de finais do século XVIII.

Era então um lugar inóspito e desabrigado onde dominavam terrenos pantanosos e dunas com escassa vegetação rasteira sem outra protecção contra a inclemência do Verão.

Era também um lugar isolado pelos vastos pinhais (do conde de Arcos) que o separavam da Trafaria (então principal porto de pesca da zona) e do Monte de Caparica, tendo por isso proporcionado abrigo a salteadores e piratas.

Foram pescadores de origem algarvia e de Ílhavo que começaram por se fixar na Costa apenas durante os meses de Outubro a Dezembro, construindo para o efeito choupanas de junco e colmo, que incendiavam ao partir.

As primeiras companhas de pesca a fixar-se com carácter definitivo fazem-no em 1770.

Instituíram a figura do "Cofre dos Quinhões", organização de carácter mutualista e assistêncial que provia à protecção e alimentação dos órfãos e das viúvas, ao pagamento dos ordenados na ausência de faina e ainda à construção e/ou beneficiação de edifícios de interesse comum: vedação do cemitério, construção da igreja e do poço de água doce que abastecia a população.

Praia do Sol, C. Caparica, ed. José Nunes da Silva, s/n, Poço de Bomba, Chafariz
Imagem: Delcampe

Numa descrição do local de 1896, a Costa continua a ser uma zona de "grandes pântanos, outrora cobertos de juncos e hoje quase totalmente cultivados de vinhas e arvoredos".

Costa da Caparica, Carta dos Arredores de Lisboa — 68 (detalhe), Corpo do Estado Maior, 1902
Imagem: IGeoE

O centro da povoação situava-se no areal, onde havia o conjunto de “várias barracas de colmo, da origem primitiva, salpicadas agora de grande número de brancas e singelas casinhas”.

Hoje [1978] não há rivalidade entre as famílias daquelas duas regiões, mas resta a Rua dos Pescadores, sinal da antiga fronteira.

Correia, Romeu, Homens e Mulheres vinculados às terras de Almada, (nas Artes, nas Letras e nas Ciências), 1978, Almada, Câmara Municipal de Almada, 316 págs.

A norte está a igreja, "abaixo da rocha, ao norte do pântano, destaca-se o pequeno cemitério, ao fundo do vasto areal, sempre cortado por médos ondulantes de uma finíssima areia, espraia-se na extensão de 3 léguas o oceano Atlântico".

Existiam nesta data 8 companhas de pesca, que lançavam as redes entre o mar da Laje e a Fonte da Telha, numa distância de 2 léguas.

Em 1824 existia uma única casa de alvenaria em toda a povoação, possivelmente construída por volta de 1820, pelo seu proprietário, mestre de redes José dos Santos.

Costa da Caparica, casa da coroa
Imagem: almaDalmada

A esta casa ficou ligada a lenda da presença do rei D. João VI que, após aqui ter comido uma caldeirada, mandou colocar na fachada a sua coroa de armas.

Brasão e Coroa do Reino de Portugal antes colocados na "casa da coroa"
Imagem: caparica news

Vários incêndios ao longo dos tempos deflagraram na povoação [...]
Em 1840, o grande fogo, denominado da Quinquilharia [do quinquilheira], devorou 98 barracas;

em 1864, outro fogo, rememorado como o da Rosa do Cheché, reduziu a cinzas 55 choupanas;

em 1884, um terceiro sinistro ficou na história da região como o Fogo do Costa Pinto, pelos grandes benefícios que por essa altura foram recebidos do honrado deputado por este círculo, tendo ardido ainda desta última vez 60 barracas.

Costa da Caparica, Depois do incendio de 1884, desenho de Rafael Bordalo Pinheiro
Imagem: Hemeroteca Digital

Convém citar aqui o nome completo desse cidadão: Jaime Artur da Costa Pinto (1846-1909), conhecido nestas paragens como o Pai dos Pobres, pela sua entrega total ao bem comum.

Costa da Caparica, As novas edificações, 1887, desenho de João Ribeiro Cristino
Imagem: Hemeroteca Digital

Correia, Romeu, Op. Cit.
A partir de 1884, devido à intervenção do deputado às Cortes, pelo círculo de Almada, Jaime Artur da Costa Pinto, a Costa de Caparica vai ser sujeita à construção de uma primeira urbanização, de 54 casas de alvenaria e um arruamento (Rua Jaime Artur Costa Pinto).

Jaime Artur da Costa Pinto
Imagem: Almanach Illustrado do Correio da Europa

Oito anos antes a igreja tinha sido reedificada em "pedra e cal" por acção de um "brasileiro" residente [João Inácio Alfama, ou João Inácio da Costa].

Costa da Caparica, ed. Lif, 04, Igreja da Nossa Senhora da Conceição, 1945
Imagem: Delcampe

Em 1882 foi aberta a vala de esgoto e iniciaram-se as florestações, numa tentativa de melhorar as más condições ambientais que ainda persistiam.

No nº. 1 do jornal A Realeza, de 2 Setembro de 1882, é publicado o artigo "Direcção do pântano do Juncal e fixação das dunas e arborização dos terrenos da Trafaria e Costa de Caparica, onde se pretendia efectuar a arborização em pinheiros e eucaliptos numa área de 1500 hectares para prender as dunas ou areias moventes da Caparica, vale da Trafaria e pântano do Juncal da Costa".

A Praia do Sol, Um trecho da estrada para Trafaria, ed. Acção Bíblica/Casa da Bíblia, 112, década de 1930
Imagem: Delcampe

Considerava-se ser esta a melhor acção para terminar com a vasta extensão pantanosa que rodeava a povoação, provocando frequentemente epidemias e paludismo.

Costa da Caparica, Alameda de Santo António, ed. Passaporte, 25, década de 1960
Imagem: Delcampe, Oliveira

Por iniciativa do padre Bailie Hughes, de origem americana [sic], foi criada logo em 1876 uma sala de aulas feminina para o ensino primário e mais tarde, o Colégio do Menino Jesus, para rapazes e que existiu até 1901. (2)

Costa da Caparica, um piquenique familiar, em segundo plano a igreja e o Colégio do Menino Jesus, década de 1900
Imagem: Arlindo Pereira


(1) The TABLET

(2) Programa POLIS — Plano Estratégico da Costa de [sic] Caparica, 4. 2. 1. Nota Histórica, sobre texto de Correia, António, com citações de Vieira Júnior, Duarte Joaquim, Villa e termo de Almada: apontamentos antigos e modernos para a história do concelho, Typographia Lucas, Lisboa, 1896


Leitura adicional: Costa da Caparica