terça-feira, 27 de agosto de 2019

Ao largo! Os mesteirais do mar

O seu esforço, o seu heroísmo e a sua tragédia

Rumoreja doce, a onda, em embalo e acalento. Dedos de espuma afloram a epiderme da terra, em caricias longas de namorado. O sol mordisca ao de leve a tona glauca das aguas, irisando a crista franjada das vagas pequeninas. Gaivotas, aos bandos, abatem as azas pandas sobre a campina movediça e mergulham os colos alvos na babujem do engodo, gualdindo solregas grandes tassalhos de peixe. Ao largo, o mar, percorrida toda a gama dos verdes, vai acabar azul, confundindo-se com o ceu. Passam revoadas de alciones. É a alegria da manhã.

Na Costa da Caparica - Alguns aspectos da vida do pescador (cliché de A. Santos)
A Batalha, n.° 21, 21 de Abril de 1924

Na praia, sobre a areia loira, garotos tisnados, como santolas loucas, retouçam ao sol. Os barcos varados, brilhantes de côres, trescalam a maresia. Dos casebres negros, encolhidos contra-o-vento, vem a falacia cantada do mulherio e um fartum acre de peixe e alcatrão. Velhos em farrapos, faces rugosas, cobertas de liquens do, mar, ou glabras polidas como rocha batida da vaga — compõem serenamente as redes trigueiras.

Surge agora um grupo de homens falando alto, barbaramente. Molda-lhes o tronco solido uma sueira grossa e a cabeça chamorra ocultam-na no longo barrete, herdado dos seus avós do Oriente remoto. É a companha. O mestre, um alto, ruivo, tem um sueste que brilha e todos levam á vela as pernas vermelhas, velosas.

— P'ró mar?! perguntam os que ficam, na quietitude marasmada do sonho.

— P'ró mar ! — respondem os que seguem para a labuta moirejada, para a aventura, quiçá para a morte. E lá vão gingando, nodoa de sombra na claridade da praia.

Acomodam-se os utensilios a bordo.

— Arreia ! — E o barco desliza suavemente por sobre os paus encebados. Feita a manobra, a postos a companha, ao sinal da largada, todos dizem:

— Voga!

O mar tem afagos de extranha volupia ao beijar rochas hirtas, torturadas. Singram ao largo velas de purpura, fulgindo ao sol, e outras cinzentas plumbeas, como ceu de tempestade. É assim auspicioso e agoirento o espectaculo do mar.

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Ferrado o pano, o barco apoitou, que o fundo fofo de algas era proximo. Á proa, o-do-remo-da-roga vinha espalhando mancheias de engodo, num gesto largo de semeador. E começou a faina da pesca.

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*     *

O mar é a grande oficina da liberdade. Onde quere que deitem as suas redes ou mergulhem as suas linhas, os que dele vivem e nele morrem, nunca ouvem: — "Alto! Isto pertence-me !" O — "é meu" — não se diz no mar. O mar é de todos. Não tem leis, nem balizas.

O pesqueiro que hontem foi farto, hoje está deserto. Vamos que o mar é largo e lá em baixo reina a abundancia!

Emigram as especies marinhas, veem outras novas; a tempestade afugenta e mata os pescadores, logo a bonança os alicia e favorece. É assim o mar, onde tudo é mudavel e transitorio e só constantes a sua infinita vastidão e deslumbrante riqueza. E mais — o seu augusto misterio...

Que o mar tem indefinidas, espirituais influencias nos seres e nas almas, sobretudo — nas ideias. É um eterno gerador de beleza e pira onde arde constante o foge da liberdade. Até onde chegam as suas emanaçães sadias, a vida tem uma agitação promissora. Os continentes que o mar penetra e recorta são os mais progressivos, aqueles onde as ideias dc liberdade florescem com mais pujança. Exemplos? Olhemos para, o mapa do mundo.

O mar é o simbolo da Revolta e da Pureza. Não ha dejecto que o manche, nem obstaculo que não derrube.

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*      *

Acabara a pescaria. No fundo do barco a farta colheita — triunfo daquela tarde — fulgia nas escamas brilhantes do pescado, que manchas baças de epidermes viscosas cortavam. Viam-se peixes de todos os tamanhos e das côres mais bizarras, desde o safio, longo, sombrio, coleante, ennovelando-se em contrações agónicas ao peixe-rei, pequenino, vermelho-tenso, saltitante e brincalhão como um menino folgado. O mestre, agarrado ao remo da espadela, mão em pala sobre os olhos claros, murmurou para companha:

— Cia!

Havia que virar de bordo rápido. Uma aragem fria arrepiava a flor das aguas, cortando; e uma mancha de tinta alastrava no horizonte, para o Sul.

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*     *

Foi assim: O vento cresceu; tiveram que ferrar a vela e apear o mastro. Começou a cavar vaga, abrindo beiçanas de chaga com pús e gangrena nos bordos A abobada do ceu desceu mais e, de negra que era fficou amarela esgazeada. Ouviu-se, a principio ao longe, a restolhada dos trovões. Depois, mais perto, cada vez mais perto, o estalido seco dos coriscos, abrindo clareiras nos ares, logo seguidas do ribombo soturno.

O vento cresceu ainda. Chuva, em cordas grossas, vivas, caia. Alijada a carga, o barco era um ponto negro, longo tempo oculto agora nos desfiladeiros lugubres, presagos das ondas, logo projectado para o alto no dorso sombrio da vaga.

Deveria ser noite já. A tragedia da noite, em que se é mais só e desapercebido, para lutar com a dôr. O barco derivava á tôa. Ele só e a imensidade em combate singular. Dentes cerrados de anciedade, olhos pávidos de terror, dorsos abroquelados ao peso da desgraça, suando, resfolegando, praguejando e rezando — a companha ora esgotava o barco, ora se atirava para um bordo para o equilibrar, ora caia de bruços quando um golpe da vaga empinava ao alto o esquife. E assim esteve horas, na agonia.

Depois, o mar, enraivecido, torvelinhou, comprimiu mais, num abraço de desespero, a fragil presa. Rangeram as taboas, rugiram os homens e, num ultimo arranco, o ponto negro desapareceu na vastidão imensa do mar em furia.

Na praia, encharcada, mulheres de negro, com os filhos ao colo, gritavam:

— Misericordia!

O heroismo ignorado da brava gente do mar é temperado em beleza; mais — em sacrificio. Mal enxutas as lagrimas de dó pelos que se foram, voltam os pescadores á labuta, ao ganha pão dos seus, á paixão do mar. Face á Dôr e á Morte, são altivos, porque, mais do que quaisquer outros seres humanos — são livres. O mar que lhes dá pão e ensino, gozo para os sentidos e jazida na morte, dá-lhes tambem — nobreza. (1)


(1) A Batalha, Suplemento Literário e Ilustrado, n.° 21, 21 de abril de 1924

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Os pescadores de Raúl Brandão
Mário Domingues (1899-1977), escritor
etc.

Leitura relacionada:
Casa Comum, A Batalha, Suplemento Literário e Ilustrado. Propriedade da C.G.T.
A Batalha, Suplemento Literário e Ilustrado, dados editoriais
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sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Os pescadores de Raúl Brandão

Atravez dos Livros

As suas ideias, os seus sentimentos e a sua beleza

Já está publicado o anunciado livro "Os pescadores" de Raúl Brandão cujas primícias de um excerto já foi dado aos leitores deste semanário literário gozar, devido à gentileza muito especial do autor. 

Tratando-se de um escritor que já conquistou de há muito a sua consagração definitiva, embaraçados nos seriamos para apreciar o seu estilo conciso e brilhante, Limitamo-nos, portanto, a dizer que Raúl Brandão afirma mais uma vez neste seu trabalho as eminentes qualidades de escritor inconfundivel, de castiça correcção e que sabe levar a extremos de perfeição a magia da palavra literária.

No prólogo deste seu ultimo trabalho diz-nos Raúl Brandão que quando regressa do mar vem sempre estonteado e cheio de luz que o trespassa. Foi assim tambem que nos sentimos ao concluir a impressionante leitura do seu livro que é uma verdadeira epopeia, um esplêndido cântico ao mar infinito e misterioso. 

"Os pescadores" são o primeiro volume da serie "A vida humilde do povo português" que aquele poderoso escritor se propõe escrever. Nas suas páginas palpita a existência da dôr e sacrificio que é a vida do pescador, agitam-se as suas cóleras, e os seus desesperos, seja êle da Foz do Douro ou da costa de Caminha à Póvoa, da ria de Aveiro ou de Mira, das Berlengas ou da Nazaré, de Lisboa, Setúbal, Cezimbra e Caparica, de Olhão, Tavira ou Sagres.

Cliché António dos Santos
[Pescadores na Costa da Caparica]
A Batalha n.° 5 (suplemento literário), 31 de dezembro de 1923

Os pescadores são a narrativa, ora suavemente enternecedora, ora ligeiramente graciosa, ora intensamente dramática, de vida, carácter, costumes e da faina rude e das condições de trabalho do pescador de Portugal; e neste largo campo de sensações o autor, sob uma forma interessante, atraente e impressionista, faz-nos conhecer minuciosamente as diferenças etnicas caracteristicas das nossas colónias pescatórias, alguns tipos magnificamente desenhados de pescadores, termos familiares das regiões, a paisagem e riqueza das nossas costas, as várias espécies de peixe que mais abundam nas nossas águas, embarcações, aparelhos e processos de pesca, dando-nos, em episódios de acção profundamente dramática em que se movimentam figuras cheias de sentimento e de caracteres magistralmente acentuados, a impressão da angustia indefinida em que vive essa gente, da tortura inquisitorial, do constante sobresalto dos mães e das mulheres que veem partir os seus homens para o mar, e das doloridas almas das vitimas que caminham resignadas, fatalistas, para o sacriticio. 

A morte do arrais — encontrado morto no cabedelo, no dia seguinte ao da tempestade, com as mãos crispadas agarradas ainda ao leme do barco que o mar, na sua fúria indomável, partiu pela quilha, não é o único quadro trágico que o livro contem, se bem que seja um dos mais pungentes lances, mordido de cores singulares, em que o clamor do mar que mete mêdo se confunde com os gritos de aflição e de desespêro das mulheres e os choros das crianças no cais, em que a cólera do mar porfia com o esfôrço hercoler de salvação dos homens. De não menos emocionante intensidade aquela outra scena da morte de dois irmãos encontrados unidos um ao outro, o mais velho erguendo nos braços o mais pequeno procurando salvá-lo. Razão tinha a mãe, a Maria da Sé, em não querer deixar o mais pequeno ir ao mar! Quando o surpreendia com os outros brincando nas poças com barquinhos de cortiça ela bem lhe batia para que ele perdesse o sestro. Mas o mar atraia-o  irresistivelmente. E na ansia de ir ao mar, como o pai, como os irmãos, como os homens, lá foi, até que lá ficou como já tinha ficado o pai... 

Depois vem a descrição de como vive toda essa gente.

A de Mira vive com simplicidade nos palheiros, casa ideal para pescadores ou pra um velho filósofo como eu. É construida sobre espeques na areia, com táboas de pinho e um fôrro por dentro aplainado. Duram tanto ou mais que a vida; cheiram que consolam, quando novas, a resina, a arvore descascada e a monte; ressoam como um velho buzio e são leves, agasalhadas, transparentes. Por fora escurecem logo, e envelhecendo caem para o lado ou para a frente; por dentro conservam uma frescura extraordinaria, e quando se abre uma janela, abre-se para o infinito. No chão dois tijolos para o lume, em esteiras alguns peixes a secar. Do Natal até maio não há pesca: Vão cavar para o Alentejo ou para mais longe, e as mulheres ficam em casa com os filhos. Alem da jorna, que regula de quatro mil reis a dois mil e quinhentos por dia, todos teem o seu quinhão nos dias de fartura — alguns punhados de sardinha ou de chicharros. Felizes ou infelizes? Não sei bem. Apesar de abandonacios pelo Estado, que os rouba, cobrando-lhes de fisco uma exorbitancia, quatrocentos contos o ano passado e quasi o dobro este ano, não lhes dando em troca uma maternidade, uma pequena biblioteca que os instrua um médico, uma botica, uma estrada; apesar de abandonados pelos homens, sem organização nem instrução, sem um padre que lhes fale em Deus ou nos coisas eternas (a capelinha de madeira está fechada) — esta gente é tão fundamentalmente boa que ha cinquenta anos para cá, não consta de um roubo, de um crime ou de um delito. Pode-se dormir com a porta aberta, Eu nunca fechei a minha.

Quando chegam a velhos e não podem trabalhar, como não ha um simulacro de cooperativa, e a lei do seguro os não abrange, lá se socorrem uns aos outros como podem. A miséria e quasi desconhecida neste pequeno povo de mais de duzentos fogos e de cérca de mil habitantes. Mira, punhado de casebres a apodrecer — é um mundo. A vida aqui não é uma mentira. E todos os dias a arriscam, porque quási todos os dias ouço as mulheres implorando Deus, quando o barco vai ao mar e se enche de agua.

Até aos ultimos anos ninguém enriqueceu em Mira com a pesca.

Mas agora, com os preços excessivos do peixe, tudo mudou de figura. já o ano passado se ganhou muito dinheiro, quando o cabaz de sardinha dava vinte mil reis. Que fará este ano, que regula entre cinquenta e sessenta? ha lanços de cinco contos, e já e diz que alguns se sentam em libras sôbre os buracos que abrem na areia para as esconder. As casas de salga fazem tombem im grande negocio. Enriquece o almocreve, o patrão e o negociante; só o pescador continua pobre e despreocupado. O mar nunca acaba e o mar é deles...

Os pescadores da Nazaré são ingénuos e supersticiosos. Um crime é raro. Não ha policia. Teem um medo ás bruxas que se pelam.

E o pescador de Cezirnbra? Este homem é de instinto comunista. Se um adoece, Os outras ganham-lhe o pão: recebe o seu quinhão inteiro. Se morre, sustentam ate a viuva e os filhos entregando-lhe o ganho que ele tinta em vida. Dão ao hospital e ao asilo uma parte do pescado. Toda a gente tem direito a ir ao mar — toda a gente tem direito á vida. Vai quem aparece, desde que seja maritimo. Acontece que o barco leva hoje quarenta h 'meus e leva vinte amanhã... O produto das artes é dividido em quinhões iguais pela campanha. A pesca do anzol é uma espécie de cooperativa, e a barca quasi sempre dos pescadores. 

Mas este sentimento comunista é vulgar entre a gente do mar.


O pescador é comunista e alegre, o montanheiro desconfiado e triste. 

No mar não ha marcos... diz o autor ao estabelecer o contraste entre Tavira, terra de montanheiros e Olhão, terra de pescadores. 

E continuando:

O maritimo de Olhão tem, como nenhum outro, um grande sentimento de igualdade: estende a mão a toda a gente. É que no mar os homens correm os mesmos perigos. São tambem profundamente religiosos, porque estão a toda a hora na presença de Deus. Duas tábuas, a fragilidade e a incerteza, forçam-nos a contar consigo e com e companha. Arriscam a vida para salvar a dos outros: hoje por ti, amanhã por mim. Homens simples porque a profissão é simples e o meio, grande e eterno, não os corrompe. E como o mar abundante e prodigo não tem cancelas, são generosos, imprevidentes e comunistas. Detestam os tribunais, que não coompreendem, e ignoram a vida da terra. Se a mulher lhes morre, não entram em licitações com os filhos: deixarn-lhe a eles o barco e as redes, e tomem conta do resto. Reparei que em toda as casas havia uma gaiola com um pintassilgo. Os homens do mar tiveram sempre uma grande ternura pelas aves. 

E as mulheres? Não as esqueceu tambem Raul Brandão que no-las retrata com fidelidade e que se curva perante o seu esforço fisico e a sua energia moral, vendo-as calcar todo o dia as estradas vendendo o peixe, trazendo os pequenos ao colo, não se deixando dominar pela desgraça, ou fabricando a graxa, fazendo, lavando e concertando as redes, metendo hombro aos barcos para os deitar ao mar, trabalhando tanto ou mais que o homem, infatigaveis sempre e ainda lhes sobra o tempo para tratar da casa e dos filhos!

E ainda o pior para todas estas mulheres não é serem bestas de carga, dias atraz de dias encharcadas e escorrendo salmoura... A mocidade dura-lhes o que duram as rosas. Quasi sempre de uma belesa delicada, a mulher da beira-mar, com excepção da do Algarve, que é a "prenda da casas", logo que casa carrega com quasi todo o peso do lar, cresta-se e envelhece. Acusam-na de imprevideucia. Imprevidente é o homem, que gasta na taberna tudo o que ganha. O lavrador é avaro, tira o pão da arca a medo, como quem sabe o que ele lhe custa de esforços persistentes — o pescador, num dia de fartura, enche a casa de pão. E o mar inexgotavel não lhe foge... Mas ela não. Ela, remenda, poupa e vai arrancá-lo à taberna. Conheço-lhes desde pequeno os estremos de dedicação e de força diante da desgraça. Esta pobre mulher — terra virgem de ternura — merecia um lugar à parte na nossa terra, pela sua abnegação, pela sua energia, e até pela distinção de sentimentos. Em Mira o lar é sagrado. É-o em to-dos as povoações da costa portutuesa que ficam longe dos centro, corruptores. 

Mas o trabalho pesado não é ainda o pior — o pior é o sobressalto constante da sua vida. A da lavoura tem o lar seguro. Vem o inverno temeroso e a noite que não tem fim. Fechada no casebre, á roda do lar, ela, o homem e a moça, com o filho no berço (ao lado na corte os bois fartos esmoém) — sente-se tranquila; sabe que na arca puida ha meio carro de pão, o suor do seu rosto, e algumas moedas juntas. Pode o temporal abalar o teto de colmo e o nevão cair lá fora. Ardem os raizeiros no lume e as traves de castanho são eternas. O buraco tem alicerces de granito até ao fundo do globo. Quanto ao pescador, esse há-de ir ao mar, unico campo que lavra, ainda que arrisque a vida. Os pequenos pedem-lhe pão e ele não tem outro ofico. O tempo está mau e dias atraz de dias passam. — Sempre vou... — Ela sente o coração oprimido, mas cala-se. Sabe perfeitamente pelos outras o futuro que a espera. Quantas conheci sempre de luto, sem ir muito longe da minha casa!... Por fim diz: — Pois Vai... — As redes, a cesta e ele embarca. Fica com ela um bando de pequenos, e com o coração aos saltos põe o ouvido ã escuta... A onda brame no cabedelo com um eco prolongado. — Não tem duvida, é o mar que chama o leste. — Mas agora, a voz é outra, mais funda, o vento mudou para o sul e a barra cerra-se. — Irão arribar e Leixões?... — Que tempo no mar alto, na noite tragica, e só negrume em roda! Nas mãos de Deus! nas mãos de Deus!

Cabe-lhes sempre o pior quinhão da negra vida, Trabalham o dobro dos homens e vivem mais do que eles, porque sofrem muito mais. 

Retrato de Raul Brandão e de sua esposa, D. Angelina Brandão, Columbano, 1928.
MNAC

E é assim todo o livro de Raul Brandão. Por todas as suas paginas perpassam um suavissimo espirito de humanidade, um proposito de reabilitação e de justiça e um sentimento de respeito pelo Trabalho. 

"Os pescadores" é um livro que comove e... nos faz pensar... (1)


(1) A Batalha n.° 5 (suplemento literário), 31 de dezembro de 1923

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