Costa de Caparica, Alberto Carlos Lima, pescadores lançando uma embarcação ao mar, década de 1900. Arquivo Municipal de Lisboa |
Duas outras tábuas, de forma pré-estabelecida, as "tábuas dos covados", com a mesma espessura e cada uma com 26 cm de largura, são pregadas a 26 "cavernas (paus direitos)" transversais, a conveniente distância de cada lado da primeira tábua, de modo a dar ao fundo a sua forma nas "arestas dos encolamentos".
A altura das cavernas e de 8 cm e a sua largura de 17,5 cm; o seu espaçamento é de 42,5 cm.
Museu de Marinha |
Os "braços" são "paus de volta", unidos por "escarvas simples" à face superior das extremidades das cavernas. A sua espessura diminui gradualmente desde o seu pé até à borda do barco, onde a medida da cabeça da baliza é 5,5 cm. A largura diminui tambem com a subida do braço: desde 17,5 cm até 5,5 cm. O braço tem assim a forma quadrada no seu topo. Um vau arqueado ou "barrote", com 3,7 cm de espessura, reúne as cabeças do primeiro par de braços.
São então montadas a "roda de proa" e a "roda de ré", que têm 60 mm de espessura e uma largura média de 12,5 cm, seguidas pelos "forcados da proa" e os "forcados de ré", os quais são balizas em V, sem caverna. As cabeças dos forcados da proa, que se prolongam acima do nível do convés, são conhecidas por "mãozinhas" ou "golfiões".
Tendo sido braceados o fundo e a estrutura central para obter a curva desejada do "tosado do fundo",são colocadas as "tábuas de armar" cuja função é formar e fixar o encolamento.
José Cardoso Pires, à direita, na companhia de Alves Redol, Fonte da Telha, 1957. Hemeroteca Digital |
O próximo passo consiste em montar duas "cintas", uma por bordo, por fora dos braços, medindo 4x15 cm a meia nau e estreitando para 4x12,5 cm nas extremidades, para consolidar a estrutura ao nivel da borda.
Estas cintas ocupam todo o comprimento do barco, e as de bombordo e de estibordo encontram-se avante da roda de proa e por ante-a-ré da roda de ré. Formam, com o "capelo" da roda, a decorativa "bica".
São colocadas "dragas" ou "dormentes" de 3x18 cm no lado interno dos braços, com recortes para receberem os "bancos" ou "trastes" antes da montagem do "forro interior".
A borda falsa é então completada com "bordas", que são peças de revestimento de 2x18 cm escarvadas para o barrote da proa e cortadas junto dos forcados de ré. Os topos dos braços são cobertos por "remates das bordas" (1,5x11 cm), que levam "marrões" ou "chumaceiras" que suportam o atrito dos remos.
Finalmente, são montados os "vaus do convés" e as "tábuas do costado" que ficam encostadas com as cintas e que têm o nome de "tábuas de água e sol", visto que são situadas acima das obras vivas do casco.
Estas tábuas são de 28 mm de espessura e não podem seguir a curva ascendente do tosado nas extremidades do barco, onde os espaços triangulares que permanecem são cheios posteriormente por "fiadas perdidas".
Vira-se então o barco para um dos lados, e depois para o outro, para conseguir o revestimento do fundo, e calafetar e pontar as juntas. O fundo é todo alcatroado antes de endireitar o barco e terminar o revestimento do costado.
Costa da Caparica, Wolfgang Sievers, 1935. eBay |
Os estrados elevados avante e à ré são conhecidos por "paneiros da proa e da ré", e neles são montados "paus de voga" simples, de 12 cm de diâmetro, mais uns duplos, chamados recoveiras ou trilhapés, nas quais são pregadas tábuas onde alguns dos remadores trabalham de pé.
Os pequenos assentos laterais nos " remates das bordas", são conhecidos por "requintas".
À popa, os "remates das bordas" são sempre feitos em peças separadas, porque precisam de ser substituidas periodicamente, pois o atrito dos cabos de manobra, neste local, vai desgastando a madeira.
Costa da Caparica (detalhe), Bento de Jesus Caraça, 1935. Casa Comum |
Existe urn bloco de madeira de 25x15 cm, o "descanso da muleta", fixado ao cadaste, onde a "forquilha" da extremidade daquela vara é apoiada quando o barco é empurrado para entrar na rebentação do mar além do local onde os homens podem apear.
As ferragens são simples:
— existem 8 ou 10 pares de cintas de ferro, as "boçardas", colocadas 4-5 pares para vante e 4-5 pares para ré, perpendiculares às "arestas dos encolamentos", para as reforçar;
— são montadas "lavaças" ou "verdugos", abauladas e com prolongamentos de fixação sobre os "marrões", de cada lado dos "escalamões" ou "toletes";
— os "arganéus", no costado do barco, são ferros cruciformes, com o topo virado para baixo para receber as "argolas" dos cabos que seguram o barco e não o deixam atravessar na rebentação;
— e finalmente sao fixadas duas "armelas", ou "arganéus", no cadaste por baixo do descanso da muleta, para os "gatos" dos cabos de travagem usados no lançamento.
Museu de Marinha |
O comprimento das "lavaças" é de cerca de 70 cm, e os "escalamões" de ferro redondo têm 20 cm de comprimento e um diâmetro de 30 mm. O diâmetro das "armelas" é de 20 cm, e a espessura da barra redonda usada para as fazer é de 25 mm.
Os "remos" são feitos de madeira de castanheiro, eucalipto ou choupo. Nos barcos de 2 remos, têm ambos 11,9 m de comprimento. Nos barcos de 4 remos, há remos com dois comprimentos: 9 m para os remadores de proa e os de voga, e 11 m para os restantes.
O "punho do remo" é de 5 cm de diâmetro, e a medida do "cano" redondo, "cana" ou "haste", diminui desde 15 cm até 5 cm onde encontra a "pá". Um "cágado, com furo" redondo para receber o "escalamão", é pregado na parte de vante da haste, com uma peça de reforço, a "tarma", no lado oposto. O conjunto é consolidado por "arreataduras" de cabo de 15 mm de diâmetro.
Três centimetros acima do corpo do remo existe uma barra de madeira redonda, com 5 cm de diâmetro e 1,2 m de comprimento, a "cabrita", para as mãos dos remadores de pé.
(Instantaneos do sr. Alberto Lima) Costa de Caparica, Alberto Carlos Lima, pescadores puxando uma embarcação para terra, década de 1900. Arquivo Municipal de Lisboa |
Como se vê, a estrutura do BARCO DO MAR é muito simples e sem problemas maiores; mas é de admirar como dois homens conseguem construir um grande, num só mês! (1)
(1) Manuel Leitão cf. Hernâni A. Xavier, A Ascendência dos barcos tradicionais portugueses, 2008
A construção do Barco do Mar (apontamentos diversos):
Paul Johnstone, The Sea-Craft of Prehistory, 1988
Hernâni A. Xavier, A Ascendência dos barcos tradicionais portugueses, 2008
Octávio Lixa Filgueiras, Barcos de Portugal, obras selecionadas
Senos da Fonseca, Embarcações que tiveram berço na laguna
O meu barco da Arte Xávega
Terras de Antuã - Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja
Arte Xávega em Espinho
Sem comentários:
Enviar um comentário