terça-feira, 28 de maio de 2019

"Deus te guie"

De novo o Deus te guie fez proa ao mar, e o calador foi folgando cabos e pondo coiros a flutuar de oito em oito cordas. O arrais pediu fósforos, chegou o lume ao morrão do caldeiro e fez sinal para terra. Deu o brado de "ninguém reme!" e apagou a chama. 

Costa da Caparica, Deus te guie.

Houve um silêncio no Deus te guie... E o espadilheiro bateu com a pá na água.

— Abriu! Abriu peixe! — chamaram os remos, batendo cada um, depois, com gana. 

Mas os arrais berrou: — Ninguém bate! Aqui, quem dá ordes!?


Desenho do saveiro Deus te guie da Costa da Caparica.
Museu de Marinha
Fez-se tamanho silêncio que só o marulho das águas tem rumor. A bica da vante está voltada ao sul. As mãos do calador atam a corda à rede. Vão descer as primeiras malhas... Todos se descobrem. 

Desenho do saveiro Deus te guie da Costa da Caparica.
Museu de Marinha


E o arrais diz: — Vai em louvor de Nossa Senhora do Cabo! (1)


(1) Romeu Correia, Calamento, Lisboa, Editorial Minerva, 1950

Artigo relacionado:
Arte xávega por Romeu Correia

Leitura relacionada:
Ricardo Salomão, Meia-Lua: O Saveiro da Costa da Caparica, Revista MUSA 4, 2014

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